Quinta-feira, 30 de Abril de 2009

Conheci hoje o sabor da relva
O rodopio da selva das frases feitas
Faço luto pelos discursos estéreis e ocos
Elevo-me para além de pios loucos
Sou ainda capaz de descer e subir esse degrau
De me sentar à luz e saborear
Palavras de canela e de cacau
Sou forte que nem eu
Mesmo nos braços de Morfeu
Até seus delírios são oniricamente fortes
Mais dados às certezas que às sortes
Espera-me uma mesa farta
Um sofá de pele de marta
Uma cozinha mais cheia que pouca
E uma inconsolada boca
Faço luto pela incompreensão
Quando se faz noite sem razão
Quando o Sol foge da minha vigia
Se não se faz dia
Faço luto se perco a mesa
Se viciam o baralho
Se me fazem beijar o soalho
Faço luto se não me deixam fazer luto
Se fazem do relativo absoluto
Ou da matéria um produto
Faço luto e não poemas
Mesmo sem razão aparente
De fazer luto e ser diferente
Quarta-feira, 29 de Abril de 2009

Faz um favor a ti próprio e cala-te
Não vês e não sentes
Quão exaurido
Fazes timbrar essa voz no meu ouvido
Fecha a matraca da tua pena
Deixa as palavras descansar
Não tens espelhos para te mirar?
Julgas-te dono das flores, das caras e dos dias
E no entanto
Precisas de escrever outro tanto
Faz esse favor a ti próprio e cala-te
Deita-te ao luar e respira
Deixa que a traqueia se solte
E a voz te tolde
Faz o favor ao mundo de ficar calado
Deixa para quem pode esse triunfo alado
De ser poeta
De ser fidalgo escriba da treta
Cala-te ou fala
Fala antes de escrever
Mas vive antes de morrer
Terça-feira, 28 de Abril de 2009
Domingo, 26 de Abril de 2009
Eu já sabia que alguma batalha se agoirava contra o meu esqueleto
Tempo maldito e feroz que não tens por mim respeito
Nem por esta víscera que tenho dentro do peito
Desconfiei que podia passar ao lado da tua árvore
E esconder-me calado nos ramos, nas flores ou nos espinhos
Mas denunciaram-me os meus lábios
E mais o cantar de pequeninos nos ninhos
Seria apenas mais um actor figurante
Se não tivesses aberto o pano quando me via ao espelho
Ou ligasses esse holofote vermelho
Sabia que ia chegar o dia em que esta ânsia do estômago
Se transformaria em gestos desabridos de socorro
Em desesperaria pela manhã do dia
Em que não conseguiria tirar dos cabelos a melancolia
Desconfiei mas não liguei
Ao sabor térreo da fruta que comia
Ao sabor é à dor
Mas ainda já sabia
Que não conseguia
Ser um bom actor
Sábado, 25 de Abril de 2009
Sexta-feira, 24 de Abril de 2009

De repente, da alma de um povo
Em vez de balas choveram cravos
E um povo novo...
E era Abril de um ano
E começava ali
O que nunca acaba
Quinta-feira, 23 de Abril de 2009
Brevemente nova Rubrica:
DIÁRIOS DE VIAGEM
(Itália: Florença, Roma e Veneza)
(África do Sul: Durban)
Quarta-feira, 22 de Abril de 2009

Natural seria pensar que não é natural
Alguém se rir de si próprio
Que isso seria até impróprio
Se não fosse saudável e banal
Como natural é tentar fugir da sombra
Esconder também o Sol
Por os olhos e os ouvidos no rouxinol
E ter medo do monstro que nos assombra
Desagrada-me e incomoda
Não achar natural um nariz diferente
Ou mistério uma estrela cadente
Ou até como nasceu a roda
Dou por mim a perguntar a mim
Que é natural não pensar nada
Não querer sequer andar na moda
E ser normal pensar assim
Nem sei se tem a ver comigo
Se é apenas ou não espiritual
Estranhar e não ver de forma convencional
O buraco do umbigo
Foto - Priscila Tessarini - Piercing (olhares.aeiou.pt)
Segunda-feira, 20 de Abril de 2009
Talvez ingenuidade minha, quiçá
Mas há pessoas que pensam que os poetas
São perfeitos no escrever e loucos no pensar
Que colhem trevos de quatro folhas em cada poema
Que escrevem e pensar palavras perfeitas em linhas direitas
Que despenteiam os cabelos a propósito
Para disfarçar misteriosas maleitas
Mas, talvez ingenuidade minha
Ou caloirice nas palavras que deito
Há trevos murchos nos campos
Palavras piores que o meu retrato
E pudessem elas reclamar
E algumas me puniriam pelo trato
Ingenuidade minha, certamente
Pensar que florescem flores em todos os jardins
Ou que não mora pó nos móveis antigos
Ou que o pó mente
Ingenuidade e castigo
Por respirar poesia e fumar
E ingénuo, fechar os olhos e cansar