Terça-feira, 29 de Junho de 2010
Não resisti à força e espreitei
O cantinho dos meus segredos
O tremer dos teus medos
Pensei encontrar por aqui alguém
Mas procurei
Mas não encontrei
Vi rastos e pistas
Mas só isso
Nem um beijo ou desejo
Nem uma palavra nem um verso
Nem o inverso
Mas ainda assim tive que espreitar
Por esse buraquinho do céu
Uma tentação
Mais forte que eu
Domingo, 27 de Junho de 2010
Adormeci hoje a pensar que acordava daqui a uns anos
Num apeadeiro nas crateras da Lua
Onde das estrelas caíam palavras
Que faziam um texto de uma frase nua
Onde, no Mar da Tranquilidade
As pessoas perdiam a idade
Onde não se criavam raízes
E podiam ser eternamente felizes
Onde por entre naves espaciais
Voavam borboletas e flores magistrais
Pássaros Fénix imortais
E aí esperava por ti
Da tua carreira regular de Vénus
Com escala breve por aqui
Fato espacial branco cru
Por cima de um corpo nu
Olhaste e vieste a mim
Onde os semáforos espaciais eram folhas de plátano
Que só mudavam de cor nas estações siderais
Onde o tempo era imponderável
Mas o solo pouco arável
E por isso as flores cresciam no ar sem ar
E não podiam parar a idade
Nem a força da gravidade
Foste breve no olhar mas lenta no respirar
Rarefeito o ar e o teu escutar
Tinhas pressa do espaço e da sua arte
Das velocidades de anos-luz
Dos cruzamentos com Marte
De um voo espacial nocturno
Com passagem por Saturno
Pressa a amores sempre fiéis
De tocares os seus anéis
Agora de saída após a tua partida
Contemplo essa bola azul
De senhora e eterna idade
Onde tudo é terreno e destino
Onde podia tocar-te sem esse fato espacial
Sem que levasses a mal
Onde a gravidade nos agarra à terra
Onde podemos ser pensamento
Mesmo triste
Mas onde a vida existe
É só ela mesmo responde
Quando a Lua se esconde
Segunda-feira, 21 de Junho de 2010
Hoje é um dia qualquer de uma semana qualquer
Há rectas e curvas nos horizontes que me contornam
E riscas brancas nas estradas que me adoram
Existe em mim uma aura de piloto do tempo
De dono da estrada e no entanto choro feliz
O passatempo de chorar
E ser ainda da vida um aprendiz
E de mim próprio fraco juíz
Sábado, 19 de Junho de 2010
Dançarino do horizonte
Deixei atrás de mim vários ontens
Não sei como cresci
Ou até se comi o algodão doce das nuvens
Dos sóis que percorri
Ou do chão
Se um dia novo nasceu para mim
No rasto de um lindo avião
Isso é história que não conto
De um dançarino no chão
Com os olhos no avião
Quarta-feira, 16 de Junho de 2010
Queiram ou não
Apetece-me hoje ser um pouco Gedeão
E pouco eu próprio
Que não vale a pena, não levem a mal
Só vão compreender-me
Lá para o ano três mil e tal
Se nem eu próprio hoje e agora
Me compreendo afinal
E assim um sentimento anormal
Pessoal e intransmissível
Maior que todas as minhas partes
Mas menor que a maior das minhas artes
Ser eu
Ou pelo menos o “eu” possível
Domingo, 13 de Junho de 2010
Declaro aqui solenemente por minha honra
Sem vaidade ou mentira
E sem nenhuma estrela na mira
Sem querer sem fraco ou forte
Que sou contra…
Essa coisa inominável que inventaram
Chamada Morte
Sexta-feira, 11 de Junho de 2010
Há assim algo de incontável
Entre o tempo a distância
Como se o tempo fosse o modo
E o longe a substância
Bastam um milhar de minutos e mais um quarto
Para ser difícil esperar
Para ver que o tempo é mais que um período
E a substância este nó na garganta
Que nasce ao respirar
Podíamos até fazer uma conta simples
Substrair antes de somar
E se tiramos a distância ao tempo
Estaríamos perto de amar
Quinta-feira, 10 de Junho de 2010
é relativa a felicidade
e pouco moderado o prazer
ausente a liberdade
mas prazeroso o momento
é disciplinado o rio
mas tranquilo o desejo
e silencioso, de ferro, o lamento
é traidora a idade
mas impulsivo o meu ser
perfeita a noção de estética e medida
mas racional o meu beijo
míseros os meus bens
efémeras as roupas
curtas as tuas vestes
longas quando as despes
demais as penas que te vestem
pobres e geladas as mãos
distantes os olhos
que te despem
Terça-feira, 8 de Junho de 2010
Colho de manhã
Sempre um bom dia
Caído da árvore do meu quintal
É só quem me diz bom dia
Mas não posso levar a mal